17.5.15

O gato escritor.


A escrita é arte como as outras. Pega-se prática, firmeza e confiança nos movimentos. Caligrafia, gramática, leitura, experiências. Cópias, influências, um gato preto respirando forte ao lado – companhia do escritor. Jovens ainda – o gato e o escritor – mas estão aí. Um a escrever outro a tentar paciente não andar no caderno, não dar leves patadas na tinteiro. Conseguem. Dispersam, rodeiam, contudo, insistentemente, encarregam-se de suas bravas funções.

O gato é equilibrista. Sem receios passeia por altos fios com agilidade. Pula, se agarra, cai de pé.

Quem se mete a escrever tem algo de gato. As letras são finas, miúdas peças do mar de considerações, vaidades, tensões humanas. O escritor é curioso igual ao gato. Quer saber como é ver as coisas lá do alto. Para, posição segura de felino, as quatro patas no chão – pontua. O texto é sempre a corda bamba. Não há meio de saber como nem quando ventará, se algo assustará o gato e o equilíbrio se perderá. Por isso, eles vão alto. Procuram suas musas e alimentam-se pelo caminho. Curiosidade, coragem, pulgas e ventos fortes.

Porém, ah, porém, os dois nada são sem um ao outro. A história se conta – não se cria.


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