25.2.15

A primavera da pontuação, de Vitor Ramil [1962-]

Incrível como nossa língua é rica. Ainda mais evidente quando Vitor Ramil usou criatividade e conhecimento gramatical para escrever “A primavera da pontuação” (São Paulo: Cosac Naif, 2014). Livro saboreado e desvendado aos poucos, que reúne inúmeras menções literárias, linguísticas e históricas em meio a uma trama envolvente. Vale acompanhar com atenção os felizes trocadilhos cuidadosamente lapidados pelo autor durante a saga dos protagonistas ‘Palavra-Caminhão’ e ‘Ponto’, que mais tarde, por motivos semelhantes, trocarão de nomes. Leia que é bom.

“Em meio ao pânico provocado pelas notícias dessa fuga em massa, cometeremos o primeiro atentado, cujas vítimas serão os verbos que fazem flexões aos sábados no Parque Central. (...) De quebra, daremos início à nossa cruzada contra os arabismos e algarismos arábicos, já que realizaremos a ação de modo a fazer deles os principais suspeitos.” (p. 57)

“O atentado contra os adjetivos uniformes fez os pais segurarem os filhos em casa e as instituições de ensino fecharem as portas, principalmente depois que dois pretéritos imperfeitos foram considerados os dois suspeitos do crime.” (p. 97)

E nesse ritmo segue o livro.




Amálgama, de Rubem Fonseca [1925-]

Gostei. Escrita inteligente, fina estrutura, ousadia temática. São textos variados que mexem com nosso sossego, nos tiram do cotidiano de repetições e do politicamente correto para o espaço da desordem e da realidade nua. Porém, (não se enganem) Rubem Fonseca sabe o que está fazendo. Em meio, à primeira lida, de algum espanto, o leitor reconhecerá o escritor consagrado e bem-humorado da obra. Recomendo.  


“Este dizia que não cabe no poema o preço do feijão.” (1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013, Em ‘Sopa de Pedra’, p. 27)


19.2.15

Salmo 129.

Na benção das cinzas, Mosteiro de São Bento de Vinhedo, ontem. Coral muito bonito, mensagem digna de transcrição. Belo Salmo poético. Veja que belo trecho: “A minh’alma espera no Senhor mais que o vigia pela aurora.” Aprecie –, sem moderação:

“09. Distribuição Das Cinzas II                                           

Confesso o meu pecado a Deus e aos irmãos:
contrito e humilhado, ao Céu levanto as mãos.

Das profundezas eu clamo a vós, Senhor,                                   Sl 129
escutai a minha voz!
Vossos ouvidos estejam bem atentos
ao clamor da minha prece!

Se levardes em conta nossas faltas,
quem haverá de subsistir?
Mas em vós se encontra o perdão,
eu vos temo e em vós espero.

No Senhor ponho a minha esperança,
espero em sua palavra.
A minh’alma espera no Senhor
mais que o vigia pela aurora.

Espere Israel pelo Senhor
mais que o vigia pela autora!
Pois no Senhor se encontra toda graça
e copiosa redenção.

Ele vem libertar a Israel
de toda a sua culpa.”

13.2.15

O cinema.

Impressiono-me com a intensidade do cinema. Como um bom filme projetado em superfície morta possa causar sensações de tensão, de alegria, de medo, de tristeza e, principalmente, de reflexões diversas. Difícil sair impune.  
Apagam-se as luzes, ajustam-se as saídas de som e o foco do aparelho emissor da imagem. Daí para frente é algo, sem exageros, mágico. O espectador, atingido pelo aparato cinematográfico, é levado para dentro da transmissão. Ele e o filme se entrelaçam. É o que dizem: “a trama ganha vida na telinha”.
Quando há boa montagem, rico enredo, a arte toca o sujeito. Risadas, caretas, suspiros, olhos fixos, espremidas de mão do vizinho, sorrisos, lágrimas, gritos, sustos, palmas.
Filmagens tão reais e profundas que incomodam. Pensamento confuso. “Será mesmo ficção? Sim, é ficção. Será mesmo realidade. Sim, é possível. Uau. Nossa, que horror.”
Sensações que transcendem o cinema. A sessão termina, os sentimentos perduram. Reflexões várias, intrusão profunda.
Vale, então, o alerta: o cinema pode causar relevantes encontros de você consigo mesmo. Vá ao cinema. 


9.2.15

Vegetarianismo. De novo.

Sem carne. 
Até que ponto sustentamos nossos objetivos? Busco isso, quero aquilo, não farei, farei, para sempre, hoje, essa semana, nos próximos cinco anos, nessa hora, agora.
Quais os benefícios desse esforço na minha vida? Realmente quero? Preciso?
Banho frio.
Coragem, mente sã, vontade, superação.
Basta querer. Está lá, é só buscar. Quão verdadeiras palavras? O que é possível, impossível, viável, adequado para o homem? Há limites?
Como diz a ciência, usamos cerca de apenas 10% da capacidade do nosso cérebro. E já existem infinitas combinações, aprendizados, criações, novidades.
Talvez valha a ideia de que nada é impossível, até que alguém diga que é. Não acredite. Há vários modos para alcançar resultados e diversas metas equivalentes. No caminho, inclusive, novas oportunidades, novas visões sobre a mesma coisa e, sim, novas passagens para o mesmo trajeto.
Enfim, posso ser vegetariano, posso tomar banho de água fria. Todo dia, inclusive hoje, incluindo amanhã e depois.
Nossa capacidade de atingir metas é ilimitada. Se surpreenda. Queira, aja, consiga. É batata, pode crer. Se não der certo, é porque não era a meta certa. As certas, acredite, você alcançará. E como saber quais são as certas? Fácil, está escrito na testa delas “eu sou a meta certa”. Se não souber ler, ela grita. Se não ouvir, empurra. Se não sentir, engole. Se não, não sei não.
Bora. 


4.2.15

Preto.

Todo. Jovem, magro e muito agitado. Aberta a porta de casa, logo quer arranjar jeito para sair. Corre pelas escadas acima ou abaixo, até o limite do desconhecido.
Era para se chamar Baiano, mas, imaginamos eventuais polêmicas e optamos por Bach. Ótimo. Gostamos de música clássica. Homenagem merecida.
Naquela manhã, como sempre, ele estava muito agitado. Corria pelo apartamento feito doido e tentava pular em mim. Ele gosta de subir no meu ombro e ficar pendurado no meu pescoço. Como eu estava atrasado para sair, acabei dando umas assustadas nele, de brincadeira, para ver se ele sossegava. Nada de mais, apenas encaradas e o velho súbito “tchhhh”. Eles não gostam disso. Se assustam, eriçam os pelos, arregalam os olhos. Ele correu mais e sumiu.
Procurei, procurei, chamei ele diversas vezes, abri e fechei portas de quartos e armários (às vezes esquecemos ele dentro). Nada. Será que arranjou um jeito de pular lá para baixo? Difícil. Colocamos telas nos quartos, cozinha e sacada. O outro banheiro estava aberto e não há rede de proteção na janela. Talvez tenha sido por lá. Enfim, desisti de procurá-lo e desci.
– Você viu um gato preto passando agora? Acho que meu gato caiu do apartamento.
– Vi, vi. Está nos fundos, atrás daquela árvore.
– Ai, caramba. Ando depressa, sem correr, com receio de assustá-lo.
– Baaach, Baaaach. Correu.
–  Não, não, para. Correu mais e passou pelo vão da água da chuva, para um terreno ao lado.
– Carai, já era.
– Anota meu celular. Vou em busca desse danado.
– Você v... Não. E, você, viu um g... Não. Eu vi. Acabou de escalar o telhado ao lado.
– Não acredito. Vou lá.
Era uma concessionária de veículos, com uma área de lavagem de carros coberta nos fundos. Ele deveria estar na cobertura de um dos espaços de lavagem. Estava. Um funcionário subiu na caixa d’água ao lado e viu o gato.
– Tá lá, parado, encolhido. Deixa eu ver se se mexe. E tacou pedras no animal (o animal). Se mexeu com agilidade, claro, e entrou no primeiro buraco que encontrou. Um pequeno vão entre a cobertura e uma viga próxima à parede do último alto biombo de limpeza dos carros.
Não vi isso. Quem viu foi outro funcionário. Fui lá. Subi uma escada comprida e tentei visualizar o bichano lá dentro. Bem complicado. Havia um tampão de lata entre o muro e o início do vão. Era muito escuro e nada de mios, barulhos.
– Mas ele tá mesmo lá dentro? Perguntavam.
Comecei a duvidar.
– Você viu mesmo ele entrando?
– Bem, acho que sim. Vi sim. Foi bastante rápido.
– Será que ele pode já ter saído?
Batemos na cobertura, chamei pelo seu nome. Nada certo. Às vezes, parecia ter ouvido pequenos ruídos ou um ou outro miado, mas muito de longe, muito incerto.
Os bombeiros. – Não iremos, há outra ocorrência mais grave.
Uma lanterna potente. Devo conseguir avistá-lo. Um amigo meu trouxe o instrumento. Subi, entortei um pouco o tampão do buraco (não sabia ao certo sua profundidade e comprimento, cheguei mesmo a pensar que era alto o suficiente para matar o coitado) e vi seus olhos brilharem na luz artificial. Estava bem ao fundo do buraco comprido, mas raso. Imóvel. Se mexeu um pouco e sumiu novamente, mais para o fundo.
– Preciso entrar lá, depois consertamos esse latão. (Esse meu amigo já tinha sugerido isso, tendo inclusive trazido um pé de cabra, uma marreta e pregos para o reparo.)
Entrei. Nada do gato. Mais ao fim outro vão, muito estreito e comprido. Era a parede do fundo da área de limpar os carros.
– Puxa vida. Sacanagem. Ele estava lá. Já no meio do caminho. No final, outra fenda, para a luz.
Ficou lá um tempo.
– Vamos botar comida aqui, jogar um pouco perto dele. Quem sabe? Feito. Nada.
Nesse tempo, já tinha chegado uma prima minha para ajudar, mulher desse meu amigo. Ela conseguiu convencer os bombeiros a virem. (“Se não vierem logo, não será só o gato que resgatarão.” Hehe, boa.)
A comida, como dito, não adiantou. Piorou. Ele prosseguiu pelo caminho estreito e ao invés de sair pela fresta final, entrou em outro buraco, para baixo da construção, entre terra e tijolos furados.
Os bombeiros chegaram. Entra no buraco, sobe na cobertura. Nem sinal.
– Vai ver está no meio desse outro muro. Os tijolos são furados, capaz de haver interligação entre eles. E há outro vão detrás desse muro. Deve sair uma hora, os gatos são espertos. Não podemos e nem é prudente quebrarmos a parede sem saber onde ele está. Se é que ainda está atrás da parede. Pode ter encontrado uma saída para a rua.
Das nove horas da manhã, já duas da tarde. Deixei meus telefones com os funcionários da concessionária, mais comida do lado de fora do primeiro buraco, e fomos almoçar.
Que coisa.
Fui para casa. Quem sabe não está aí dentro, nem saiu de casa?! Não. Procurei bem antes de sair. Abri a porta. Geralmente logo aparece, se já não está na porta miando. Não dessa vez. Olho para um lado, para o outro. Triste. Imagino come será contar para a minha esposa. – O Bach está dentro de uma parede da empresa dos fundos. Quem sabe ele sai, ou não ou foge para sempre?! Buáááá.
Vou escovar os dentes, desanimado, frustrado pelo esforço em vão.
Os rabos dos felinos costumam dizer muitas coisas. Se erguido, com pouco movimento, significa que o gato está animado, quer atenção, brincar. Se eriçado, o gato está com medo, assustado. Se balançar demais, rapidamente, ele está incomodado, estressado. – Sai de perto de mim.
Estava ereto, vagaroso. O reflexo do espelho denunciou.

    

3.2.15

O poder de escolha e o meio ambiente.

Já tomou banho gelado no inverno? Podia tomar quente? Por que tomou frio? Para economizar na conta de luz, para poupar água? Fechou a água enquanto se ensaboava? Que frioooo.
Qual o valor das nossas escolhas perante a natureza? Podemos fazer alguma diferença? Sim.
E por qual razão tomamos banho quente no inferno?
– Poxa, se tomar frio vou ficar doente.
Mas, você também toma quente nas outras estações do ano, ou não?!
– Inventaram a eletricidade, o aquecimento à gás, a captação da energia solar, cacildis.
E a educação ambiental.
Tomar banho frio não adoece ninguém, por si só. Os meios artificiais de temperar a água gastam muita energia, mesmo o solar, pois este depende, para manter a água quente, de matéria prima (plástico, minerais etc.) não renovável em sua estrutura funcional.
A água quente doméstica, claro, é necessária. Mas é possível usá-la menos. Bem menos. Isso reduz nosso impacto (que é enorme) no planeta. O que é extremamente necessário hoje.
O banho frio é possível. Faz bem para a pele, para o ânimo, para o nosso querido meio ambiente.    
Tente tomar banho gelado hoje. Aproveite que ainda estamos no verão. Coragem. Você tem escolha (ainda).
(Esse pensamento vale para qualquer outra escolha: separar material reciclável; manter em dia a manutenção do carro; optar por meios alternativos de locomoção (bicicleta, transporte público, carona etc.); ser vegetariano; comer menos “fast food”; não jogar lixo em vias públicas e em outros lugares inadequados (inclusive a maldita bituca do seu cigarro); consumir, de modo geral, menos etc.)