30.9.13

XXI. Você é.



Já era tarde, frio e Nermo estava cansado. Mas, mesmo que por um breve momento, mesmo que incompleta, foi em busca da resposta a sua pergunta.
Havia dias sem qualquer sinal de qualquer envelope ou outro meio de comunicação de Neroy.
Teria imaginado? Não. Queria respostas. E quando queremos muito algo, ah, algo mágico tende a acontecer.
A resposta veio. O envelope apareceu ao alcance de suas mãos, sem explicação, na estante de seu quarto.
“Olá, novamente.” Dizia a carta.
“Sua resposta, por certo aguardada, agora se materializa. Você, Nermo, é aquilo, é isso, é somente o que é. Sem mistérios, sem complicações. Você é. Você é o Nermo. Único.”
“Na sua vida há, além disso, formas perceptíveis da própria existência, seja física, seja espiritual.”
“Sinta os sentidos (os cinco) e suas percepções próprias.”
“Seus gostos. Não gosto daquela fruta, gosto daquela árvore.”
“Se aquiete, acalme-se e sinta sua mente. Estás vivendo. Além dos seus sentidos existe o Nermo. És espírito. Passageiro do corpo. Mente sã, corpo são.”
“Você é isso. Tudo isso e só isso. Em relação, em primeiro lugar, a você. Em último, a você também.”
“Você é você, Nermo. Pronto. Vá dormir, agora. Vejo que está bastante cansado.”

Até onde quisermos ir.

até onde vai o homem?
até seus pensamentos
ou até seus sentimentos?
vai por entre ideias
ou quem sabe caminha de ações?
sabe do universo o mesmo que sobre si.
ser abstrato e infinito
seja e seremos homem
e só
até onde quisermos ir.


what is the limit for the man?
your thoughts
or your feelings?
a path through ideas
or perhaps moves by actions?
understands the universe as knows himself.
abstract and endless human being
be it and let it be
that's it
to where we would want to go.

MCP

25.9.13

XX. Perguntar.


Neroy. Perguntas. Que perguntas? Nermo tinha lá perguntas? Tudo ia. Seu trabalho, sua vida pessoal, o mundo. O mundo ia.
Claro que Nermo tinha perguntas. Ah, quantas ele tinha. Poderia passar o resto de sua vida fazendo perguntas.
Nermo, enfim, achou a oportunidade sensacional e logo escreveu sua primeira pergunta naquele papel misterioso: Neroy, quem sou eu? Dobrou a folha, depositou-a dentro do envelope e este foi para a caixinha. Foi trabalhar, já era hora de iniciar sua labuta diária.

                                                                                 MCP

23.9.13

XIX. A carta.


Naquele dia, pela tarde, bem tardizinha, Nermo recebeu uma carta.
Estava em seu jardim, abriu a casinha das cartas e lá estava ela.
Era simples. Fina. Destinatário, endereço. Não havia remetente.
Abriu. Uma página, apenas. Dizia, em letras de forma bem escritas: pergunte. Só isso.
Nermo acreditava. “Quem é você?”, escreveu. Fechou o envelope. Fechou a portinha. Foi-se.
No dia seguinte, logo quando acordou, o envelope estava sob a mesa.
Quem, como o teriam colocado ali? Não foi em busca dessa resposta. Estava interessado em uma e só uma.
 Abriu o envelope. A mesma folha. Com sua pergunta escrita e, opa, uma resposta. Oito palavras. “Sou Neroy. Aquele que responderá suas perguntas.”

20.9.13

ODE (OU BODE) AO (DO) TEMPO.


2.7.2013
Vida. Tempo. Sono. Compromissos espontâneos. Voluntários. Escolhidos por mim. Sim. Não é de outro jeito. Escolhemos. Fazer isso ou aquilo. Comprometemo-nos hoje, amanhã, dois dias, uma semana, meses, anos, por tempo indeterminado. Vai que vai. O ônibus que passa em cima das oscilações do pavimento, e, por cima das vicissitudes do viver, eu.
Escrevo, porém. E isso, de alguma forma, me conforta. Ao menos, nisso acredito. E pronto.
E o tempo? Ah, seu Tempo. Ah, se eu te pego, rs. Não dá. O tempo escorre por entre os dedos. Pego ele não. Só posso andar ao seu lado. Nem atrás, nem adiante. Tudo que faço agora pensando no futuro (de nada adianta fazer algo pensando no passado – não posso mudá-lo) dependerá do futuro, da passagem do tempo, da espera. Pura angústia. Tormento. Estresse. Não. Nem sempre. Não é esse o pensamento. “Se me diz que chegará as três, desde as duas estarei te esperando.” Grande Saint-Exupéry, o autor do clássico “O pequeno príncipe”.
Quando digo que não podemos andar adiante do tempo, penso que não posso tomar banho de lua cheia se a lua cheia só surgirá no firmamento em uma semana. Tenho que esperar essa uma semana. Ao revés, não poderei mudar o que aconteceu, o passado, acabado, perfeito. Foi. “Um tempo bom que não volta nunca mais.” Diz Thaíde em uma música.
O tempo é agora, enfim.
Mais: o tempo é perceptível. Sim. Sei que trafego nele. Vejo o dia raiar e, em seu final, findar com a achegada da noite que terminará dando ensejo a novo ciclo natural dos trópicos. Das 00:00 às 23:59 tenho um dia. Um novo dia. Perceptível. Descritível. Hoje choveu, fui em tal lugar, encontrei fulano, não fui ao trabalho, vi um morcego, comi jaca, dormi oito horas e cinqüenta minutos (ah, estou precisando). Posso descrevê-lo, mas, e aí se inicia, novamente, a velha questão singular e “amazing” que impressiona, mexe com a gente: a vida é o tempo.
O tempo é a vida. O tempo, chuf, passou. Tempo, vuuuuf, transcorreu. A vida, zusf, passou. Vida, zissssfi, encurtou. Issssstim, cheguei em Vinhedo. A vida, como o tempo, passa. Percebemos ela, veja bem, como percebemos o tempo.
Fica nisso. O momento para a vida é um mistério. Que dirá de amanhã? Do amanhã?
Podemos planejar, não podemos ter certeza da consecução do plano, porém. Senão não seria plano, é claro. Mas, um fato, uma certeza. Não. Não há isso nas escolhas humanas. Claro, há probabilidades. Só. Contudo.
Aí paramos (no tempo, claro) e pensamos: what a fuck, carai, vivo, estou vivo, logo vivo, estou vivendo. Podemos isso perceber. A questão é: ok, vivo, porra, que legal, que interessante. Fica nisso (novamente). Nada além. Não há conclusão. Não há resposta. Nada. Nadinha de pitibiribas. Neff. Nicas. None. None sense. What a fuck, enfim.

Era isso. O tempo e a vida são conceitos impróprios. Inspiram as mais diversas e misteriosas divagações. No fim, porém, não se chega, pois esse ponto já não é mais a vida, já não é mais o tempo. Não obstante, seja um lugar que só o tempo e a vida nos levarão.
Aguarde, meu caro.
Até lá, confesse, como o filósofo, que “só sei que nada sei”.
Se quiser escrever qualquer coisa sobre isso, pode.

MCP

XVIII. Rodoviária.




Jardimverderelva, 1º de abril de 2013.
Manhã de outono, segunda-feira.
Perdi vários ônibus. Não marquei o lugar com antecedência. Eis que tenho alguns minutos justificáveis para escrever ao sol matutino. Ouvir os pássaros, ver a libélula dando pequenos sobrevôos na lâmina da piscina e de vez em quando, tocando-a.
Sentar na beira da mureta gelada de tijolos e absorver o ar da manhã. Muito bom.
São 7:35. Hora boa. O sol já é soberano há mais ou menos uma hora e meia. O dia se inicia calmamente para muitos. Para outros, há muito já se iniciou, rapidamente.
Para mim, caminha sem pressa. Por mais preocupado que eu talvez esteja (um pouco), não ligo. Dou-me o luxo de vê-lo passar. Em seu ritmo. Não depressa ou devagar. Não. Mas, em seu ritmo. No ritmo do tempo. Que é único. Que é como é e pronto.
Como essa história. Essa história, Nermo acabava de pensar, solitária. Se solitária, mais devagar, vagarosa, monótona? Solitária. “Sui generis”. Pensou. E, achou melhor essa última definição. “Sui generis”. Como o tempo, como seu ritmo, particular, única. E pronto. Afinal, todas as histórias, tudo, é único, são únicas. E o contraste comanda a humanidade.
Nermo gostava da idéia do contraste. Já havia escrito sobre ele. Contraste aquilo, contraste aquilo outro. Coca-cola isso, parede verde isto. Coca-cola na parede verde. Sementes de girassol. Um grande exemplo de contraste, achava.
As primaveras, a branca e a vermelha, de sua “home sweet home” estavam lindas. Mais a branca do que a vermelha. Cachos e mais cachos pendentes de pequenas e firmes flores brancas. (Ia escrever florzinhas, mas a primavera não era bem uma florzinha – muitas eram bem menores, como o jasmim.)
E era isso. Logo deveria se encaminhar para a rodoviária. Tentaria pegar o das 8:30. Se não conseguisse, leria o livro do “Sarry Throter”. O primeiro, pois lera do quarto ao sétimo recentemente e quis ler os três primeiros (de novo). Achava a C. F. Bowling ótima. Foi.
Foi se preparar para o caminho da rodo. Rodo, rodo, rodo.

9.9.13

Primavera.



14/8/2013:
Primavera, primavera, primavera chegue logo.
Embeleze a vida com seus brotos e flores.
Traga a confirmação da esperança por dias mornos e visão de renovação.
Ah, primavera, chegue logo.
9/9/2013:
E os ventos mornos já acariciam a noite.
Os brotos outrora na espreita, hoje já ao sol.
Sol bom. Calor.
Blusa, já para o armário. Boa menina.

XVII. Lero-lero.


Em quanto tempo se conta uma história? Horas? Dias? Meses? Anos?
O que é uma história? Acontecimentos? Personagens? Suspense? Aventura? Reviravoltas?
Só sei que essa história é lenta. Não tem pressa. Nas pautas, nas linhas, vagarosamente ela se arrasta. De vez em quando.
Dias ou outros, eis seu narrador-personagem de volta a tecer descrições, novos personagens, bagunçar, historiar. E, quem sabe, ao final dessas páginas, uma história surgirá. Quem sabe? Ele não sabe. Não, não. Mas, escreve. Hoje, ontem e amanhã pretende, pretendeu, escrevinhar. Escrevinhou. Linhas preencheu. Idéias no papel branco com pautas registrou. Assim é, sempre foi assim, assim será.
Dia de sol, domingo de Páscoa. Nermo estava bem. Boa saúde, tranqüilo com a vida. Apreciando a vista da janela. Ah, e que vista. Um lindo céu azul em contraste com as árvores verdinhas cravadas no alto do morro. Algumas casas e um som forte, constante de cigarras. Muitas cigarras.
Ele já havia comido muito chocolate, mesmo antes do domingo. Quando era pequeno tinha que esperar para ganhar ovos de chocolate. Crescido, não mais.
Ainda ia para o almoço com a sua família e a família da prima, a Gertrudis. Gostava da Gertrudis. A família dela era bacana também.
Era isso. Promessa de um belo domingo de Páscoa. Mais um. Seu vigésimo sétimo, por certo.
Não estava com muita inspiração, ânimo, disposição para escrever, é verdade.
Foi.

                                                                                       MCP