1)
Sorteio de cinco palavras de jornal:
-
Horizontes
-
Educação
-
Naturais
-
Cidade
-
Local
2)
Escolha de uma frase “e se”:
E
se descobrisse que serei pai da pessoa mais importante?
Conto:
Sem chão.
Construí
minha casa em local de solo bastante instável. Já são três anos sem
deslizamentos, mas a Defesa Civil diz que o morro pode ruir a qualquer momento.
Tenho que deixar meu lar amanhã.
Ontem
minha mulher completou oito meses de gravidez. Ganhamos muito pouco para
sustentar uma criança. Qual educação poderei dar para esse ser inocente?
Hoje,
no caminho do trabalho vi um gato preto morto. Estava no meio da ciclovia.
Pergunto-me se quando voltar para casa ele ainda estará lá. Dessa vez é um
gato. Geralmente é lixo. As pessoas jogam lixo pela janela de seus carros e os
arbustos da via de bicicletas acumulam detritos.
A
cidade, por isso, é suja. E se eu colocasse o gato em um saco e jogasse numa
daquelas caçambas de rua? Fico triste de vê-lo lá jogado à espera da limpeza
urbana.
Amanhã
continuarei no meu barraco. A Defesa Civil deve voltar com a polícia. Os
soldados me puxarão pelo braço e eu resistirei moralmente e fisicamente. Irei
preso por resistir à ordem estatal. Minha companheira continuará à espera do
nosso filho.
Sem
moradia perco minha dignidade. Tudo isso muito me preocupa. Deixo meu posto na
fábrica, atravesso a avenida, o terreno baldio do fim da rua, e sento na terra
nua, escondido nas sombras naturais de médias árvores. Choro. Vejo os
horizontes estreitos, minha vida sem esperanças.
“Seu
filho é a pessoa mais importante”, ouvi. Susto. Abro os olhos rapidamente,
procuro a fonte, mas estou sozinho. (Até hoje não sei se partiu de fora ou
mesmo da minha própria mente naquele momento conturbado.)
Fico
sentado no chão por mais alguns minutos. Talvez cinco ou dez. Não poderia, nem
se quisesse, esquecer a frase, “seu filho é a pessoa mais importante.” Meu
filho?! Sou um pobre sujeito. Amanhã perco meu chão –, literalmente. Não pode
ser.
Levanto-me,
quero ir até o bar tomar cerveja. Não vou. Grande porcaria a bebida. Volto para
casa. Minha mulher está descansando, trabalha meio período. “Saí mais cedo do
trabalho, estou muito estressado, como faremos amanhã?” “Não nos encontrarão,
estaremos trabalhando.” “Voltarão no fim de semana.” “Daremos um jeito, fique
tranquilo.”
No
dia seguinte fui trabalhar. Voltei para casa, minha mulher conversava com um
funcionário da Defesa Civil – na entrada da favela, ao lado de um carro
carregado com nossas coisas. Iríamos para a chácara dos patrões dela – como
caseiros. Fomos.
Oito
meses e três semanas. Contei para ela sobre o que ouvi naquele dia sentado na
terra. “Por que a surpresa?” “O que há de mais importante do que nosso filho?” “Não
mais existimos simplesmente. Você como pai, eu como mãe, ele como filho, nós como três somos
um, somos outro, novo.” “Vai trabalhar homem, já é hora.”
Muito bom Pi! Adorei!
ResponderExcluirQue bom. Volte sempre :-)
ExcluirMuito bom! Sucesso!
ResponderExcluirValeu, Isaaaac.
ExcluirMuito bacana..
ResponderExcluirMe faz pensar em como muitas vezes nossos problemas se resolvem de forma diferente da esperada...
Boa, Marcus. Eu diria que quase sempre é assim, hehehe.
ExcluirSeu melhor texto. Me arrepiou!
ResponderExcluirPoxa, Giu. Seu melhor comentário, hehe. Abraço, Pi.
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