Estou no ponto de ônibus. Passa o carro do outro lado da estrada vicinal. Há tráfego bastante e consigo ver bem o motorista. Ele canta e olha para mim. Som alto, bem alto. Dust in the wind, Scorpions. Parece animado.
Gosto de imaginar o dia a dia da pessoa aleatória. Esse deve ter dormido mal - há mais de dia. Não tem as finanças em ordem. Tem crises familiares complexas. Seu trabalho é uma pasta digitalizada com algarismos que outro provisionou. Ele não deve estar bem, enfim. A janela do passageiro também está escancarada. São nove e quinze da manhã, apenas.
Amanhã talvez veja ele novamente. Com os vidros fechados. Ou, não veja. Nem ele a mim, nem eu a ele. Por termos nos atrasado, pela condução adiantada, pelo cisco no olho, pelo vizinho tagarela.
O carro se distancia. Ele, certamente, ouve a canção novamente. Gosta de fazer isso: ouvir a mesma metáfora seguidamente.
Poeira ao vento, tudo o que somos é poeira ao vento. Lembrei a letra. Faz sentido.