22.4.15

Xarope artificial de groselha.

Tudo é natural, mesmo o ser humano. Por que diferenciar natureza e homem, grão orgânico de geneticamente modificado, produto natural de artificial? Não. Polêmico, esse assunto deve ser enfrentado. Não somente por cientistas, filósofos ou ambientalistas, mas por mim e você.
Lidemos com fatos: a maioria da matéria do universo é composta pelos mesmos elementos básicos (carbono, nitrogênio e oxigênio) e, como defendeu Lavoisier, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma (Lei da conservação das massas, publicada em 1760). Por isso, vivemos em função das mesmas nesgas de grama do vizinho falecido há mais de duzentos e cinquenta anos. Só as geadas que são mais raras.
Isso significa que a invenção considerada mais geniosa é apenas uma transformação, manipulação humana originada de “c” + “n” ou, se muito, de - “o”. O resultado é sempre o mesmo, a derrocada do velho para o surgimento do novo. ‘Novo’ só na palavra, no conceito, pois a novidade é tão somente o velho transformado, modificado, artificial. Ora, mas o início do texto não dizia que tudo era natural?
Abra o dicionário. Procure o vocábulo ‘natural’. Deve encontrar algo como, entre outras definições: (1) da natureza; (2) em que não há trabalho ou intervenção do homem; (...) (11) aquilo que é conforme a natureza (Miniaurélio Eletrônico versão 5.13, 2004). E se fossemos um pouco além da definição formal?
A boa e velha groselha traz o seguinte alerta: ‘xarope artificial sabor de groselha’ (parece coisa do seriado do Chaves, ‘suco de tamarindo com sabor de limão’ – e é). Talvez você nem saiba que groselha é uma fruta (eu também por muito tempo não soube) e que realmente esse xarope não contenha qualquer traço da pequenina fruta, além da cor. A composição é clara, sempre começando pelo elemento em maior quantidade (sabia dessa?): açúcar, água e aroma artificial de groselha.
E daí?!
E daí que esse xarope ocupou e ainda preenche as despensas de milhares (talvez milhões) de brasileiros de todas as raças, classes sociais etc. E?! O sabor artificial de groselha é glucose de milho. Ok, ok. Quero dizer com isso que não importa o quanto algo seja “modificado”. Sempre, no início, no meio, no fim, será natural.
Esqueça a definição do dicionário. Natural significa outra coisa. Natural é tu tatu. É o computador que obedeceu os comandos para a escrita deste texto, é a caneta de plástico, é o xarope artificial de groselha. Pois, todos provêm dos mesmos primordiais componentes básicos.
Enfim, quando Raul Seixas dizia que as pessoas não entendiam a letra da música ‘Ouro de tolo’ que ele tanto cantou, talvez ele tivesse razão. Não precisamos viver a sociedade alternativa que ele encenava nos palcos, contudo pensemos mais nisso: “eu devia estar sorrindo e orgulhoso por ter finalmente vencido na vida, mas eu acho isso uma grande piada e um tanto quanto perigosa.”
O que é vencer na vida? Isso também é natural (lembra da primeira frase do texto?).
Naturalmente, você não entendeu nada. Nem eu. Tudo bem, natural. 


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